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Disparidades no Acesso ao Trastuzumabe no Brasil: Impacto na Sobrevida de Pacientes com Câncer de Mama HER2-Positivo

Introdução

O câncer de mama é a neoplasia maligna mais comum entre as mulheres no Brasil e no mundo. Entre seus subtipos, o câncer de mama HER2-positivo representa cerca de 15 a 20% dos casos e está associado a um comportamento biológico mais agressivo e maior taxa de recorrência. Felizmente, a introdução do trastuzumabe revolucionou o tratamento dessa condição, aumentando significativamente as taxas de resposta patológica completa (pCR) e melhorando a sobrevida global (OS) e a sobrevida livre de doença (DFS).

No entanto, há uma discrepância considerável no acesso a esse medicamento no Brasil. Pacientes tratadas no setor privado têm um acesso muito maior ao trastuzumabe do que aquelas atendidas no Sistema Único de Saúde (SUS). Esse desequilíbrio impacta diretamente os desfechos clínicos das pacientes e destaca uma necessidade urgente de políticas públicas voltadas para equidade no tratamento do câncer de mama.

O Papel do Trastuzumabe no Tratamento do Câncer de Mama HER2-Positivo

Desde sua aprovação, o trastuzumabe tem sido um marco na terapia do câncer de mama HER2-positivo. Ele é um anticorpo monoclonal que bloqueia a via de sinalização HER2, reduzindo o crescimento tumoral e aumentando a apoptose das células cancerosas. Estudos clínicos demonstraram que a combinação do trastuzumabe com quimioterapia neoadjuvante melhora drasticamente a taxa de pCR, o que está diretamente relacionado a uma maior sobrevida global e menor risco de recorrência.

A quimioterapia neoadjuvante é especialmente importante em pacientes com câncer de mama HER2-positivo estágios II e III. O objetivo é reduzir o volume tumoral antes da cirurgia, permitindo um procedimento mais conservador e aumentando as chances de erradicação completa da doença. No entanto, para que esse tratamento tenha o melhor efeito possível, é fundamental que o trastuzumabe seja utilizado de forma ampla e acessível a todas as pacientes elegíveis.

Desigualdade no Acesso ao Trastuzumabe no Brasil

Estudos recentes comparando o acesso ao trastuzumabe em hospitais públicos e privados no Brasil revelam diferenças preocupantes. Em um estudo realizado em duas instituições de referência em São Paulo, constatou-se que:

  • No setor privado, 83,4% das pacientes receberam trastuzumabe durante o tratamento neoadjuvante.
  • No setor público, apenas 60% das pacientes tiveram acesso ao medicamento.

Essa diferença estatisticamente significativa compromete diretamente os resultados do tratamento. As pacientes que receberam trastuzumabe apresentaram taxas de pCR significativamente mais altas, o que está associado a uma menor probabilidade de recorrência e maior taxa de sobrevida.

Impacto na Sobrevida das Pacientes

A desigualdade no acesso ao trastuzumabe tem consequências graves para a sobrevida das pacientes:

  • No setor privado, a taxa de sobrevida global (OS) em 5 anos foi de 80%.
  • No setor público, essa taxa foi 61%, uma diferença estatisticamente significativa.
  • A sobrevida livre de doença (DFS) também foi maior no setor privado (89% vs. 67% no setor público).

Esses resultados evidenciam que pacientes tratadas em hospitais públicos têm menos chances de atingir uma resposta completa ao tratamento e, consequentemente, uma menor chance de sobrevida a longo prazo.

Fatores que Contribuem para a Disparidade

A desigualdade no acesso ao trastuzumabe no Brasil está ligada a diversos fatores:

  1. Atrasos na Incorporação pelo SUS: O trastuzumabe foi aprovado pela ANVISA em 2002, mas só foi incorporado ao SUS em 2012. Além disso, a distribuição do medicamento nas unidades públicas teve início apenas em 2013, criando um atraso de mais de uma década em relação ao setor privado.
  2. Falta de Disponibilidade Contínua: Em muitos hospitais públicos, a oferta do trastuzumabe é intermitente devido a problemas logísticos e cortes no orçamento.
  3. Ausência de Terapia Dupla: Enquanto pacientes do setor privado podem ter acesso ao esquema combinado de trastuzumabe e pertuzumabe (dupla inibição de HER2), essa abordagem ainda é rara no SUS.
  4. Demora na Confirmação do Status HER2: Antes de 2018, o SUS exigia testes moleculares para confirmar a expressão HER2, o que retardava o início do tratamento.

Propostas para Melhorar o Acesso ao Trastuzumabe

Para reduzir essa desigualdade, algumas medidas precisam ser adotadas:

  • Expansão do Tratamento HER2-Direcionado no SUS: Garantir que todas as pacientes com câncer de mama HER2-positivo tenham acesso rápido e ininterrupto ao trastuzumabe.
  • Disponibilização de Terapia Dupla (Trastuzumabe + Pertuzumabe): Esse esquema já é padrão no setor privado e deveria ser acessível também no SUS.
  • Redução da Burocracia nos Testes Diagnósticos: Simplificar e acelerar a confirmação do status HER2, eliminando exigências que retardam o início do tratamento.
  • Fortalecimento das Políticas de Equidade em Saúde: Investir em programas nacionais que garantam a igualdade de acesso a tratamentos oncológicos.

Conclusão

O impacto do trastuzumabe na sobrevida de pacientes com câncer de mama HER2-positivo é inquestionável. No entanto, a desigualdade no acesso ao medicamento no Brasil compromete os resultados do tratamento e aumenta a taxa de mortalidade entre pacientes do SUS.

Para garantir que todas as mulheres tenham as mesmas chances de cura, é essencial que sejam implementadas políticas públicas que promovam a equidade na assistência oncológica. O SUS deve priorizar a ampliação do acesso ao trastuzumabe e outras terapias-alvo, assegurando que todas as pacientes tenham a oportunidade de um tratamento eficaz e justo.

O futuro do tratamento do câncer de mama no Brasil depende dessas mudanças. Somente com esforços coordenados entre governo, profissionais de saúde e sociedade civil poderemos garantir um sistema de saúde mais igualitário e eficiente para todas as mulheres brasileiras.

Dr. Idelfonso Carvalho é um renomado profissional cuja carreira multidisciplinar reflete um profundo compromisso com a saúde e o bem-estar humano. Com uma impressionante formação em Medicina pela Universidade Federal do Piauí (2002) e em Direito pela Universidade Regional do Cariri (2018), Dr. Carvalho construiu um percurso profissional notável, destacando-se em diversas especialidades médicas e contribuindo significativamente para a área da saúde em várias capacidades.

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